Semana da Vida: 01 a 08 de outubro de 2014


“Somos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual [...] de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte, de fome um pouco por dia, de fraqueza e de doença [...] em qualquer idade, e até gente não nascida”, nos dizia João Cabral de Melo Neto em seu poema mais conhecido. Sim, a vida é frágil em todas as suas fases, por isso devemos, antes de tudo, celebrá-la com alegria, e também promovê-la e defendê-la.

Nesse sentido, a Comissão de Promoção e Defesa da Vida da Arquidiocese do Rio de Janeiro comemorou a Semana da Vida, de 01 a 08 de outubro, com várias atividades, a fim de propor reflexões e atitudes concretas em favor daqueles que encontram-se em situação de grande fragilidade, como as  pessoas portadoras de deficiências, as pessoas aditas, as pessoas que vivem nas ruas, e as pessoas enfermas desamparadas. Assim, passamos a descrever algumas das atividades da Semana da Vida de 2014 em nossa Arquidiocese.

Em 01 de outubro, Dom Antonio Augusto Dias Duarte celebrou a Missa de Abertura da Semana da Vida na Capela Nossa Senhora Aparecida do Santuário do Cristo Redentor do Corcovado. Participaram da celebração dirigentes da Pastoral Familiar, membros do Movimento em Defesa da Vida, integrantes do Instituto Eu Defendo, secretárias de várias paróquias do Vicariato Norte, a convite do Padre Cláudio dos Santos, que concelebrou a Eucaristia, e a cantora Elba Ramalho.

Em 04 de outubro, aconteceu a Jornada da Vida, que apresentou sete pequenas palestras, na igreja São João Batista, em Botafogo. O evento começou com o testemunho do jovem casal Andréa Ferrari e Pedro Zuazo, casados há quase um ano, e esperando seu primeiro bebê, a Luiza. Eles relataram que, diante da notícia da gravidez, muitos lhes perguntaram porque não esperaram mais tempo para começar a ter filhos, o que causou neles um misto de alegria e desconforto. Foi então que decidiram, em suas próprias palavras: “inverter a lógica, nesta ordem: confiar em Deus, começar uma família, experimentar e arriscar, sem medo”. Neste contexto, a mamãe gestante de oito meses perguntou a todos: “Se o Anjo Gabriel aparecesse para um jovem casal para falar sobre a vinda de seu primeiro filho hoje, o que eles responderiam: que devem aproveitar os primeiros anos de casamento para viajar e curtir, que estão estudando para concurso público, que precisam de um emprego melhor, que primeiro devem ter casa própria, ou que estão juntando dinheiro para trocar o carro?”. E concluíram: “quanto mais nos abrimos, mais Deus é generoso”.  Em seguida, outros dois jovens casais falaram sobre a experiência de formar famílias numerosas.

O casal Suzana e Wagner Oliveira, que tinha planejado ter dois casais, teve quatro meninos, “por enquanto”, como eles mesmos esclareceram. Marido e mulher nos falaram de pelo menos três vantagens que a família grande tem: “nos obriga a depender mais de Deus, facilita a educação, já que todos precisam conviver com as qualidades e defeitos uns dos outros, e todos se sentem úteis, porque precisam cuidar uns dos outros”. Wagner disse que “a lógica da família numerosa é outra”, isto é, não é a lógica que prevalece no mundo de hoje, e explicou “ao invés de enfrentarmos mais dificuldades, temos mais ajuda uns dos outros e contamos também com a ajuda dos avós”. Ele também disse que “quem planeja muito se frustra”. Isso dá o que pensar.

O casal Áurea e Carlos Favilla revelou que nunca definiram quantos meninos e quantas meninas queriam ter porque sempre estiveram totalmente “por conta de Deus”. Carlos disse que querer ter muitos filhos não tem nada a ver com ter mais ou menos estudo, pois seu avô, que era homem culto, teve 14 filhos, e  esclareceu: “a forma mais simples de viver o Evangelho de Cristo é estar aberto à vida, ou seja, é estar aberto à vontade de Deus”.

Dom Antonio Augusto resumiu a fala dos três casais citando uma frase que um dia leu de longe, quando seu carro estava parado num engarrafamento: “temos medos bobos e coragens absurdas”. Isso é que é síntese.

Em seguida, ouvimos a Irmã Caroline Shaefer, da Obra da Misericórdia, que nasceu na França, na década de 1980. A religiosa informou que no Rio de Janeiro, a Associação Mãe de Misericórdia até o momento apenas trabalha com mulheres marginalizadas, a maioria das quais sequer considera-se pessoa, mas tão somente mero objeto, motivo pelo qual precisam tanto de ajuda. Ela inquietou os presentes com uma frase perturbadora: “sabemos que a vida é um dom de Deus, mas não vivemos como se soubéssemos disso”.

Irmã Caroline nos disse que a Virgem Maria, que esteve ao lado de seu filho durante sua crucificação, pode nos mostrar o que fazer nos momentos de sofrimento e como permanecer de pé. Ela nos lembrou que na Encíclica Evangelho da Vida, o santo Papa João Paulo II nos pede urgência e ao mesmo tempo contemplação, o que somente conseguimos quando temos uma vida de serviço e de oração.

Ela nos disse que quando as mulheres marginalizadas engravidam os voluntários da Associação Mãe de Misericórdia não dizem que “tudo vai dar certo”, mas imitam Maria, que simplesmente “estava lá”, contemplava tudo em silêncio, e tinha a certeza da ressurreição.

Depois foi a vez de Marcela Lamonica Rego falar sobre a promoção humana das pessoas portadoras de deficiência intelectual, no escopo do trabalho do Movimento Fé e Luz. Ela relatou uma experiência surpreendente: em 1971, famílias de quinze países que tinham membros com deficiência intelectual fizeram uma peregrinação ao Santuário de Nossa Senhora de Lourdes, na França, durante a Páscoa. Havia cerca de 12 mil pessoas, sendo quatro mil delas deficientes. A alegria da convivência durante a peregrinação foi tão grande que no dia seguinte do Domingo de Páscoa nasceu o Movimento Fé e Luz, formado por comunidades que reúnem, em cada uma delas, de quinze a quarenta pessoas: crianças, adolescentes ou adultos com uma deficiência intelectual, seus familiares e amigos, especialmente jovens. No Brasil, as primeiras comunidades começaram em 1977 e são hoje cerca de 90 comunidades, em dez estados brasileiros. Mas em quê consiste o trabalho do Movimento Fé e Luz? Os membros de cada comunidade reúnem-se regularmente para criar laços de amizade e também para organizar retiros espirituais, peregrinações, passeios e colônias de férias, tudo para aproximar as pessoas. Pode parecer pouco, mas todos ganham muito com essa convivência. E perguntou aos presentes: “não é um paradoxo ficarmos tão alegres nas nossas atividades diante de tanto sofrimento?” Por fim, ela fez um apelo: “precisamos muito da ajuda dos jovens; peçam a eles para comunicarem-se conosco pelo e-mail: feeluzcampobelo@bol.com.br. Muitos vão descobrir um sentido para a própria vida”.

Continuando a Jornada da Vida, chegou a vez de ouvirmos o testemunho de Alexandre Machado Duque, da Comunidade Católica Maranathá. Ele relatou que, na década de 1990, um grupo de integrantes da Renovação Carismática Católica da igreja do Sagrado Coração, no Méier, aproximou-se de pessoas com dependência química e de mendigos, nas ruas do entorno da igreja, e que logo o número de voluntários aumentou, e o trabalho começou a expandir-se, até finalmente tornar-se Comunidade Católica Maranathá, que hoje oferece apoio espiritual e técnico a centenas de pessoas em vários lugares do estado do Rio de Janeiro e também nos estados de Minas Gerais e Goiás. Duque esclareceu que os voluntários precisam preparar-se para o trabalho, a exemplo do “bom samaritano”, que conseguiu socorrer aquele que estava na rua porque cercou-se de recursos para poder fazê-lo. Ele explicou que o trabalho da Comunidade Católica Maranathá apoia-se no tripé oração, trabalho e intervenção técnica, às vezes com a ajuda de medicamentos. E terminou: “o dependente químico é o Cristo desfigurado na pessoa do nosso próximo, que tem uma família, e tem uma história".

Mais tarde, o assunto foi a promoção humana das pessoas moradoras de rua. Quem conduziu a reflexão foi Helena Gomes das Chagas, da Pastoral da População em Situação de Rua, do Vicariato Sul. Ela revelou que há famílias que estão nas ruas há gerações, que nunca viveram em uma casa. Ela fez um apelo: “precisamos elaborar projetos e levá-los à Câmara dos Vereadores e à Assembleia Legislativa para socorrer a população de rua numa tentativa de resgatar a dignidade daquelas pessoas e reinseri-las na sociedade”.  Ao final, a palestrante convidou todos para as atividades que serão realizadas na Paróquia Santa Cecília e São Pio X, em Botafogo, com a população de rua de vários bairros, no fim deste mês. Vamos ajudar?

Por fim, o médico Antonio Carlos Babo Rodrigues, da Pastoral da Saúde do Vicariato Leopoldina nos falou sobre a promoção humana das pessoas enfermas desamparadas. Ele explicou que o trabalho mais frequente da Pastoral da Saúde é visitar pessoas doentes em hospitais ou em suas casas. Ele complementou que a Pastoral da Saúde também colabora nos grupos de Alcoólicos Anônimos e Narcóticos Anônimos, em igrejas. O palestrante esclareceu que não apenas profissionais da saúde fazem esse trabalho, mas também pessoas que são treinadas como “agentes de saúde”. Ele revelou que doentes geralmente não querem ouvir, e sim falar, por isso não devemos procurá-los com o objetivo de evangelizá-los ou de levar a eles a Eucaristia, mas principalmente para escutá-los. E concluiu: “quando eles querem ouvir a Palavra de Deus e comungar, então providenciamos tudo”. E você, já pensou em atuar como agente de saúde, para ouvir pessoas que precisam tanto conversar um pouco? Quer receber o treinamento? Então procure a Pastoral da Saúde junto ao seu Vicariato, ou mesmo junto à Arquidiocese.

As atividades da Semana da Vida encerraram-se em 08 de outubro, com a Missa celebrada pelo padre Omar Cardoso, na igreja Nossa Senhora do Parto, no Centro, com a participação de representantes dos vários grupos que compõem a Comissão de Promoção e Defesa da Vida da Arquidiocese do Rio de Janeiro, dirigentes e membros da Pastoral Familiar, e também de muitas mulheres assistidas pelo Centro Social Nossa Senhora do Parto.

O cartaz de divulgação da Semana da Vida mostrava uma bela pintura da Mulher Cananeia. Sejamos como ela, que saiu de casa não para pedir muito tampouco para pedir para si mesma, mas para sua filha, que estava doente. Ela contentou-se com pouco e recebeu tudo o que precisava.

Concluindo, voltemos ao início: ao personagem do poeta pernambucano que lamentava a morte, mas sabia celebrar a vida:

[...] é difícil defender, só com palavras, a vida [...] mas se responder não pude à pergunta que fazia, ela, a vida, a respondeu com sua presença viva. E não há melhor resposta que o espetáculo da vida: vê-la desfiar seu fio, que também se chama vida, ver a fábrica que ela mesma, teimosamente, se fabrica, vê-la brotar como há pouco em nova vida explodida; mesmo quando é assim pequena a explosão, como a ocorrida; mesmo quando é uma explosão como a de há pouco, franzina; mesmo quando é a explosão de uma vida severina.


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